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Desde criança que eu gosto de usar mochila

Passei boa parte de minha vida com uma em minhas costas. Dentro dela, livro, revista, disco de vinil, bodoque, bola de gude, paracord e todo tipo de coisa que se possa imaginar. Depois eu subia em minha bicicleta e me mandava para o meio do mato. Ficava lá, lendo, dormindo, comendo frutas, tomando banho de rio, vivendo.

Lembro que quase ninguém gostava de ler e que ninguém gostava de ficar no meio do mato ou trancado no quarto durante um feriadão inteiro. Eu vasculhava de tudo, até filosofia, sociologia, história e principalmente literatura em meio à natureza e ao recolhimento. Colecionava pôsteres. E tinha até uma foto do Raul Seixas que tirei de um jornal local e que colei em um pedaço de madeira para não amassar dentro da mochila. Sim, parecia um baú, ao invés de uma mochila.

E relatei tudo isso para dizer que a arte nunca foi algo de gosto popular. Claro que aonde você for, haverá um radinho tocando uma música, alguém usando a camiseta de uma banda enquanto anda pela rua, essas coisas. Mas eu me refiro ao gosto consciente pelo conhecimento e pela arte.

Eu guardava meus trocadinhos para comprar arte. Sim, tinha de comprar para ouvir, para ler, para ter. Mas, o que vejo atualmente é uma grande quantidade de conteúdo esparramado pela internet e que fica condicionado ao algoritmo. Entre o usuário que não se interessa e o usuário que não consome, mas acessa, chegamos aqui.

Vivemos um tempo em que as plataformas sociais estão interessadas em causar turbulência emocional em seus usuários. Há dias estou longe de plataformas assim e conforme vou me desintoxicando e conversando com amigos fico observando os fatos que me relatam e percebo o condicionamento nocivo. Quando a gente se afasta de plataformas com tais características a vida fica melhor. Mais perto de conteúdos interessantes.

Estímulos são necessários, mas creio que ética também é algo imprescindível. E isso falta em demasia a um bom número de plataformas sociais atuais. Sendo honesto, o contexto geral se parece com aquelas festinhas em que se paga um valor pequeno e se pode beber até enlouquecer e arrumar confusão. Antigamente se pagava com dinheiro, na portaria da festinha, agora se paga com a alma, com a privacidade e com a sanidade emocional. E muita gente que considero inteligente acima da média anda sucumbindo ao condicionamento excessivo sem dar-se conta.

Acho viável a democratização da arte via internet. É uma opção interessante. É de graça, mas é preciso vasculhar com afinco para driblar o jabá e o condicionamento exercido pelos algoritmos. Lembrando sempre que conhecer e acessar é relevante, só que depois de conhecer é indispensável que se consuma arte. Obviamente que não estou falando de colonização mental e sim de expansão mental.

O tempo e a vida são sinônimos de prazer ou de aborrecimentos. Contudo, é preciso escolher o que fazer de nosso dia. Acho que o maior entrave para que se tenha uma população interessada em arte e amiga do conhecimento passa invariavelmente pela programação mental que é feita em larga escala e que acontece dentro de plataformas sociais nocivas.

Enfim, posso dizer que embora alguns fios de cabelos e barba brancos estejam surgindo em meu couro cabeludo e em minha face, o meu quarto e a floresta continuam me encantando como se ainda fosse juvenil. Eu faço parte de um pequeno número de pessoas esquivas a exposições desnecessárias.

Leio todo dia. Anoto alguma coisa diariamente. Penso e tento desvendar o que não conheço. Eu não me acho uma pessoa inteligente. Mas sou fã de autores como Rubem Fonseca. Um cara que veio ao mundo para escrever. E que vendeu seus livros sem aceitar entregar sua liberdade e sua sanidade mental a ninguém.

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