Eu não participei das manifestações de 2013.
Desde o início, sentia o cheiro ruim. Sabia que uma articulação política estava
em andamento. E sabia que inflamar uma grande massa era possível. Eu sempre
soube que a grande mídia que apoiou o golpe, fosse para lucrar, fosse para ter
audiência ou mesmo para influenciar na eleição seguinte, não tinha nada de
inocente (embora tenham virado a casaca, rapidinho, quando a água bateu em sua
bunda). A gama de veículos e pessoas ligadas a políticos notórios sempre foi
enorme. Eu também sabia que a justiça era seletiva em nosso país. Sabia que o
investidor quer retorno, quando pensa em injeção de dinheiro. Sabia que o
resultado da eleição seria o retrato da semelhança. Eu também sabia que não
existe consciência de classe. E a partir do momento em que Jair Bolsonaro
chegou ao poder falando em Deus e destilando aberrações eu farejei o futuro
como se pudesse prevê-lo. Eu já conhecia o comportamento hipócrita que nos
cerca desde cedo. Eu sabia das manobras usadas para tornar tudo lento. E o
desprezo pela vida alheia nunca foi um segredo para meus olhos e ouvidos. A
única coisa que eu não sabia era que haveria uma pandemia. Mas, eu também sabia
que declarações polêmicas e absurdas polarizam o público. Eu sabia que o poder
só tem um inimigo: o povo. E que o capitão do mato sempre foi um traidor. Eu
sempre soube prestar atenção nos fatos. Eu sempre soube como se fazia calos nas
mãos. E sempre compreendi o valor de uma caneta.
O serviço começou com o enterro do contato. Quem entregou o dinheiro nunca voltou para casa. E o atirador deu um cuspe em cima da terra que usou para cobrir o corpo. Quem pagou não falou com ele. E quem foi fichado em sua caderneta não sonhou de noite. Uma bala. A cabeça de um lado. E o corpo do outro. Como sempre!