De algum jeito, alguma coisa está
diferente. Sinto que vejo mais longe, mais fundo. E que meus calos me libertam.
Tenho cheiro de terra em minhas mãos e, também, das fragrâncias de jardim. Abençoado,
lavo minha alma em meio à natureza todo dia. Penso que voltei ao berço de meu
âmago para resgatar minha sabedoria de menino. Sinto que tenho algo bom que me apanha
por dentro. E não estou disposto, a perder nem mesmo um tantico das coisas boas
que vingaram em minha vida, assim, por descuido, debaixo, de um sol, tão quente.
Saio para levar o lixo até o contêiner. O tempo está carregado e vem mais chuva e mais desgraça e isso está me atormentando. Tem um vento frio que se parece com o que sopra no inverno. Alguns pássaros cantam ao tempo em que motoristas afoitos buzinam e gesticulam uns para os outros sempre que dois ou três carros se encontram em uma esquina. Logo vejo dois cães que me cercam e começam a latir. São os mesmos de todos os dias. Agora, manter os próprios cachorros na rua como se estivessem em área privada é o novo normal. Aliás, não aguento mais essa teoria de o novo normal para tudo, como se o mundo houvesse virado de cabeça para baixo. Em pouco tempo escuto rosnadas, olho firme para um deles e digo em alto e bom som: se tu te bobear vou ter de te chamar na pedra. O cão pressente que existe algo de diabólico comigo e hesita. Largo o lixo para dentro do contêiner e em dois segundos tenho quatro pedras em minhas mãos. O canino, incrédulo, ainda me olha e eu olho para ele. Lá pelas tantas v...