Embrenhei-me em uma ilha de mata ao
pé de um riacho. Fiquei lá, na paz, olhando o horizonte e o céu, as estrelas, a
lua, as borboletas, os pássaros e as coisas mais simples da vida. Sem chateações,
sem internet, sem linha telefônica, sem horários definidos para comer ou dormir.
Sem me preocupar com dinheiro. É uma oportunidade que se desvenda em minha vida
há algum tempo e que faz parte de um projeto que envolve a formação de uma
agrofloresta. Estou juntando tudo que há de bom na vida. Instalei meu
minhocário em tal espaço e semeei todo tipo de semente frutífera nativa da
minha região pelo lugar e confio que o tempo dará conta de tudo. Quero implementar
uma horta gigantesca e viver com um pouco mais de liberdade e sossego a cada
dia. O mundo moderno não me atrai. Já tem um tempo que passo a maior parte de
meus dias envolvido neste projeto que trato como sendo minha aposentadoria e
começo a vê-lo tomar a forma que gostaria que tivesse quando o idealizei ainda
nos meus tempos de universitário. Acho que vale a pena apostar em uma vida mais
tranquila, minimalista e natural. Quero um corpo, uma mente e um espírito
sadios, quero um futuro sustentável e fim de papo.
Saio para levar o lixo até o contêiner. O tempo está carregado e vem mais chuva e mais desgraça e isso está me atormentando. Tem um vento frio que se parece com o que sopra no inverno. Alguns pássaros cantam ao tempo em que motoristas afoitos buzinam e gesticulam uns para os outros sempre que dois ou três carros se encontram em uma esquina. Logo vejo dois cães que me cercam e começam a latir. São os mesmos de todos os dias. Agora, manter os próprios cachorros na rua como se estivessem em área privada é o novo normal. Aliás, não aguento mais essa teoria de o novo normal para tudo, como se o mundo houvesse virado de cabeça para baixo. Em pouco tempo escuto rosnadas, olho firme para um deles e digo em alto e bom som: se tu te bobear vou ter de te chamar na pedra. O cão pressente que existe algo de diabólico comigo e hesita. Largo o lixo para dentro do contêiner e em dois segundos tenho quatro pedras em minhas mãos. O canino, incrédulo, ainda me olha e eu olho para ele. Lá pelas tantas v...