Estou pensando aqui com meus
botões. Ler é um ato de revolução do mesmo modo que escrever também é. Um completa
o outro. A literatura dá luz ao que faz parte dos dramas humanos. Nenhuma inspiração
pode ser maior do que a vida. Acho que em muitos casos a literatura soa
intimidadora porque remexe nas entranhas de quem escreve e de quem lê
igualmente. Aprendi com Dostoiévski que não precisamos enfrentar todos os
nossos monstros de uma só vez. Porém, ler e escrever são hábitos que me cativam
desde sempre e me fizeram mais forte. Mergulho nos textos e me sinto
confortável enquanto penso em tais demônios. Vejo a estética que a literatura
compartilha ao transformar vida em arte como sendo algo primordial para nosso
crescimento pessoal e social. E numa hora destas também penso no velho Bukowski
quando disse que a gente deve encontrar o que amamos e deixar que isso nos
mate. Sei que a literatura me ganhou ainda jovem e me deu o mundo e a vida para
conhecer. Agradeço por isto todos os dias. E quando lembro daquele menino esquelético
e solitário sentado sobre o tronco de uma árvore, lendo ao sol em um dia de
inverno, só consigo pensar em salvação.
Saio para levar o lixo até o contêiner. O tempo está carregado e vem mais chuva e mais desgraça e isso está me atormentando. Tem um vento frio que se parece com o que sopra no inverno. Alguns pássaros cantam ao tempo em que motoristas afoitos buzinam e gesticulam uns para os outros sempre que dois ou três carros se encontram em uma esquina. Logo vejo dois cães que me cercam e começam a latir. São os mesmos de todos os dias. Agora, manter os próprios cachorros na rua como se estivessem em área privada é o novo normal. Aliás, não aguento mais essa teoria de o novo normal para tudo, como se o mundo houvesse virado de cabeça para baixo. Em pouco tempo escuto rosnadas, olho firme para um deles e digo em alto e bom som: se tu te bobear vou ter de te chamar na pedra. O cão pressente que existe algo de diabólico comigo e hesita. Largo o lixo para dentro do contêiner e em dois segundos tenho quatro pedras em minhas mãos. O canino, incrédulo, ainda me olha e eu olho para ele. Lá pelas tantas v...