Vi o
sinal de chuva no horizonte. Era um bom lugar para acampar e minha mochila
estava lotada de mantimentos. Estiquei a lona. Fiz fogo. Enchi um caneco com
água que colhi em um córrego intocado. Pendurei a rede e deitei. Havia um
pássaro que cantava no alto de uma paineira. Senti como se minha presença fosse
abençoada pela inteligência natural. Quando a água esquentou aproveitei para
fazer um café. Bolei um cigarro de palha e fiquei olhando a chegada da chuva. Os
pingos na lona pareciam música para meus ouvidos. Eu me sentia parte do
ecossistema que me rodeava. A minha mente estava em paz. E o meu coração
sossegado. Eu nunca tenho pressa. Afinal de contas, minha lona é minha casa. E o
mundo é um lugar imenso e cheio de lugares especiais para que a gente possa
repousar e renovar a alma.
Ando em dois mundos e agora estou distante da mata mais verde que já vi O vento castiga minha face e afaga um varal colorido que tremula Sinto que minha alma revive O cheiro do monóxido de carbono carimba meu pulmão E um pássaro canta no alto de uma árvore Contudo, sem asas, porém, também divino, um mano desconhecido corre o olho pelo trampo Sei que a calçada me abriga desde muito jovem Seja palavra Seja tinta Seja madeira Seja ferro, fogo ou brasa O que mais importa é ser Ser como se nasceu Honesto consigo e o mundo em nossa volta E ao tempo em que me sirvo da situação e anoto, estou em paz comigo mesmo Estou livre Estou participando da mudança Estou em casa Estou na rua Estou esparramando um tanto do que brota em meu coração E olhando o varal e coringando o pano, sei que ando em dois mundos Com os mesmos pés O mesmo espírito A mesma alma E a mesma satisfação de ser