O dia
era mais quente do que o normal. Fevereiro dava mostras de que o sol podia
fritar qualquer coisa. Até miolos. Então o meu senso de felino se manifestou e
tive a impressão de que deveria fazer o mangueio com inteligência. Catei uma
dúzia de livros de bolso e soquei na mochila. Conferi as tralhas e vi que
estava tudo preparado. Saí fumegando ao tempo em que sentia o calor que subia
do asfalto. Acho que essa porra vai derreter, pensei, imaginando uma gelatina
pegando em meus pés. Andei até a Primeiro de Maio, sentei no banco, descansei
alguns segundos até que o suor secasse em minha pele e grudasse a camiseta em
meu corpo. Bebi um gole de água e rapidinho estava com o varal esticado. Contei
as peças e tinha um bom volume, mais de 40. Saquei um livro como se fosse um 38
e comecei a ler. Não demorou muito e alguém parou, você vem sempre aqui, né?!,
disse, em um misto de pergunta e afirmação. Aham, venho sim, respondi. Gosto do
seu trampo, falou. Vi que era um moleque da baixada da Glória. Qual deles é o
seu preferido?, perguntei. Ele rapidamente apontou com o dedo. Deixei um
sorriso escapar como quem se entrega. Catei o desenho e disse, pode levar,
mano, é seu. O guri arregalou os olhos, apertou minha mão e disse, Afobório,
você é de fé, sorte e luz, sempre! Sem saber o que responder deixei a minha
frase costumeira para estas horas, é nóis! Acendi um careta e pensei, o
universo é justo.
O artista que expõe seu trampo na rua tem um retorno enorme. Nos últimos 90 dias fiz um estudo no qual comparei a resposta que tive empregando esforço na internet com o que consegui expondo nas praças. A ideia de fazer tal pesquisa surgiu a partir de um papo com colegas e amigos – um debate muito antigo, recorrente e maçante. Inclusive, me comprometi de apresentar dados e tenho fotos para comprovar minhas constatações. Então, esta semana, cheguei ao veredito. E é claro que o retorno da rua superou o que fora realizado através de postagens. Principalmente quando se compara a medida de esforço para realizar cada um deles em relação ao engajamento, palavra da moda. E, conforme combinado, ontem, concretizei minha despedida on-line. Este era o trato. Se a internet superasse a rua, assumi o compromisso de cessar com o mangueio e vice-versa. É importante registrar, que me propus a realizar tal trabalho porque queria saber outro dado: qual é a disposição do artista para sair a campo com se